Imprensa nacional revela esquema milionário na Saúde das prefeituras de Erlânio Xavier e seu irmão, via orçamento secreto

Imprensa nacional revela esquema milionário na Saúde das prefeituras de Erlânio Xavier e seu irmão, via orçamento secreto

Política

Uma reportagem de autoria do jornalista Breno Pires, publicada nesta edição de julho da piauí sob o título Farra ilimitada, revela que milhões de reais do orçamento secreto foram derramados em prefeituras maranhenses, em especial, nos municípios sob o domínio do Senador Weverton Rocha (PDT), como no caso de Igarapé Grande e Bernardo do Mearim, respectivamente, administradas por Erlânio Xavier (braço direito do pedetista) e seu irmão Júnior Xavier.

Há dois meses, a piauí começou a investigar o caso. Tudo começou em Igarapé Grande, uma pacata cidade de 11,5 mil habitantes na região central do Maranhão, situada a 300 km de São Luís. Em 2018, os atendimentos MAC na cidade estavam em 123 mil. No ano seguinte, quando o orçamento secreto dava seus primeiríssimos passos em Brasília, explodiram para 761 mil. Só as consultas com especialistas bateram em 385 mil, o que dá uma média de 34 consultas por habitante, um padrão que supera o recorde mundial, estabelecido pela Coreia do Sul, onde a média anual chega a 17 consultas por habitante.

Com a profusão de exames e consultas fantasmas, Igarapé Grande aumentou muito seu teto orçamentário e conseguiu atrair 3,9 milhões de reais do orçamento secreto em 2020. Nesse mesmo ano, voltou a inflar seus números. Chegou a informar que fez mais de 12,7 mil radiografias de dedo de mão – ficando atrás apenas de São Paulo, Porto Alegre e Belo Horizonte. Assim, em 2021, conseguiu ainda mais recursos do orçamento secreto: 6,7 milhões, o que lhe valeu a medalha de ouro no per capita nacional.

O sucesso de Igarapé Grande logo contagiou a vizinha Bernardo do Mearim. Na eleição municipal de novembro de 2020, os bernardenses elegeram Arlindo de Moura Júnior Xavier (PDT) para prefeito. Ele é irmão de Erlanio Xavier, o prefeito de Igarapé Grande, e Bernardo do Mearim aderiu ao esquema de imediato. De janeiro a outubro de 2020, a prefeitura registrara 2 240 consultas especializadas. Nos dois últimos meses do ano, porém, já com Júnior Xavier eleito, as consultas dispararam para 235,6 mil, atingindo uma média exorbitante de 39 consultas por habitante no ano.

Com isso, a prefeitura ampliou seu teto de gastos para 3 milhões de reais e, no ano seguinte, recebeu o teto. A parte mais significativa – 2,5 milhões – veio do orçamento secreto. “Hoje nós temos ginecologista, mastologista, ortopedista, pediatra, fisioterapeuta, assistente social, fonoaudiólogo. Nós temos otorrino. Nós temos em torno de umas dezessete especialidades”, disse o secretário da Saúde, Francisco da Conceição Moraes, de 46 anos, na tarde de uma quinta-feira de junho. No mesmo dia, a piauí visitou o hospital municipal. Encontrou apenas um clínico geral. Por volta das 17 horas, a revista se preparava para visitar a Unidade Básica de Saúde quando foi informada de que as atividades já haviam sido encerradas.

Com o exemplo de Igarapé Grande e Bernardo do Mearim, outras cidades maranhenses ligadas ao PDT tomaram o mesmo caminho. Dezenas de milhões de reais chegaram aos cofres das prefeituras apoiadoras do Senador Weverton Rocha em forma de verbas de emendas parlamentares para pagar exames e consultas com profissionais especializados, gastos que fazem parte da chamada atenção de “média e alta complexidade” – ou MAC, no jargão da saúde.

É bastante dinheiro. É mais do que receberam as secretarias de saúde de onze capitais, entre elas Florianópolis, Natal, Vitória, Belém e Manaus.

Sobre verbas per capita, Igarapé Grande levou a medalha de ouro: 590 reais por habitante. Nenhuma outra cidade do Brasil, entre capitais ou interior, conseguiu tanto dinheiro per capita.

Numa coincidência rara, todas essas cidades com altos valores per capita ficam no Maranhão, estado que concentra pouco mais de 3% da população brasileira. Dos 10 municípios recordistas, 9 são maranhenses.

Entre as 30 cidades brasileiras mais bem aquinhoadas por habitante, o Maranhão emplaca 23. Mais notável ainda é que a fatia do Maranhão nas verbas de saúde vem crescendo em ritmo acelerado. Em 2020, o estado ficou em sétimo lugar no ranking nacional. No ano passado, subiu para a quinta posição, atrás apenas de estados maiores: Minas Gerais, Bahia, São Paulo e Rio de Janeiro. Agora, contabilizadas as liberações feitas até o mês de junho, o Maranhão está no topo.

 – Propina com apelido de “volta” 

A reportagem lembra que o novo escândalo do orçamento secreto é na área da saúde. Em maio passado, o jornal O Globo começou a tratar do assunto em uma publicação na qual mostrou que o governo Bolsonaro havia entregado o controle das verbas da saúde para os aliados no Congresso, que, por sua vez, vinham turbinando os recursos do Fundo Nacional de Saúde via orçamento secreto. De 2019 a 2021, informou o jornal, as verbas do FNS cresceram 112% e o grosso do dinheiro é destinado para os redutos eleitorais de caciques do Centrão. O que não se sabia é que há um outro fluxo das verbas que percorre um notável circuito de fraudes: as prefeituras falsificam informações ao SUS para inflar seu teto orçamentário, os parlamentares mandam verbas no volume inflado e o município recebe uma bolada – mas não termina aí.

Uma parte das verbas – que em alguns casos pode chegar a até 30% do total dos recursos enviados à prefeitura – vira o que os corretores de propina em atividade no Congresso Nacional chamam de “volta”. A “volta” é a quantia de dinheiro que a prefeitura devolve ao parlamentar que assinou a emenda beneficiando o município. É uma propina paga com verba da saúde. “Ninguém fala porque é preciso ter provas concretas, mas a ‘volta’ é voz corrente no Congresso”, diz um deputado, que já ocupou altos postos de comando na Câmara. Às vezes, a “volta” faz parte do acordo desde o início. Outras vezes, a cobrança chega sem aviso prévio, na base da extorsão. O deputado federal Josimar Maranhãozinho (PL-MA) é investigado pela Polícia Federal pelo uso de grupos armados na hora de extorquir prefeitos.

A existência da “volta” explica por que há parlamentares que gostam tanto do orçamento secreto, pois a identidade do autor da emenda não é divulgada. É um plano engenhoso, que oferece recursos à farta e anonimato garantido

Nas catorze cidades maranhenses que a piauí visitou, todas com um histórico de exames e consultas inexistentes para atrair milhões de reais, são poucos os sinais de progresso no sistema de saúde. Às vezes, um posto de saúde passou por uma reforma, como aconteceu em Afonso Cunha. Ou um centro de especialidades médicas foi inaugurado, como em Paulo Ramos. Ou a prefeitura passou a realizar tomografias, como em Igarapé Grande. Mas o grosso do dinheiro está em algum outro lugar.

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