O projeto tipifica situações de abuso de autoridade cometido por servidores públicos e membros dos três poderes da República, do Ministério Público, dos tribunais e conselhos de contas e das Forças Armadas. Três destaques foram rejeitados.
O projeto que define as situações em que será configurado crime de abuso de autoridade foi aprovado em votação simbólica nesta quarta-feira (14/8), às 22 horas, no plenário da Câmara. Na sequência, foram rejeitados os três destaques apresentados pelo PSL, pelo Podemos e pelo Cidadania. À tarde, os deputados decidiram, por 342 votos a 83, dar urgência ao projeto PL 7596/2017, de autoria do senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) e relatado pelo ex-senador Roberto Requião (MDB-PR). Horas depois, os deputados decidiram votar o PL.
O projeto já foi analisado pela Câmara, mas como foi modificado pelo Senado em junho, onde foi aprovado a toque de caixa, os deputados tiveram que votá-lo novamente. Como não houve alteração na Câmara, o texto segue para a sanção do presidente Jair Bolsonaro.
O projeto tipifica situações de abuso de autoridade cometido por servidores públicos e membros dos três poderes da República, do Ministério Público, dos tribunais e conselhos de contas e das Forças Armadas, que poderão ser enquadrados no crime, e define como será o processo penal, a responsabilização e os efeitos da condenação.
Os líderes de PV, Novo, Podemos e Cidadania defenderam o adiamento da votação. Argumentaram que havia divergências em relação ao texto e que seria preciso mais tempo para analisar a proposta. Parlamentares contra o projeto argumentam que as ações inibem a ação policial e causam insegurança jurídica aos profissionais de segurança.
O Cidadania queria excluir do texto o crime de dar início ou começar um processo penal, civil ou administrativo sem justa causa fundamentada. O Podemos propôs excluir o artigo que tipifica como abuso de autoridade o uso de algemas em preso, quando não houver resistência à prisão ou ameaça de fuga.
O PSL apresentou destaque para excluir dispositivo no qual são listados efeitos da condenação, como indenização por dano, inabilitação para o exercício de cargo, mandato ou função pública por 1 a 5 anos; e perda do cargo, do mandato ou da função pública.
De acordo com o texto, a pena para quem cometer abuso de autoridade é de detenção de seis meses a dois anos, podendo começar em regime aberto ou semiaberto, além de multa. O projeto também traz um dispositivo que ficou conhecido como “lei da mordaça”, segundo o qual juízes não podem expressar opinião sobre processo pendente de julgamento em meios de comunicação.
Com relação aos membros Ministério Público, o PL define que não podem emitir “juízo de valor indevido sobre procedimento ou processo em andamento”. O projeto classifica, ainda, como abuso de autoridade juízes e procuradores “com evidente motivação político-partidária”. A proposta é considerada uma reação dos políticos às operações recentes contra corrupção, como a Lava Jato.
Ao todo, o PL lista 37 ações que poderão ser consideradas abuso de autoridade, quando praticadas com a finalidade específica de prejudicar alguém ou beneficiar a si mesmo ou a terceiro. Entre elas, obter provas por meios ilícitos; executar mandado de busca e apreensão em imóvel, mobilizando veículos, pessoal ou armamento de forma ostensiva, para expor o investigado a vexame; impedir encontro reservado entre um preso e seu advogado; e decretar a condução coercitiva de testemunha ou investigado sem intimação prévia de comparecimento ao juízo.
Após aprovação do requerimento de urgência, o presidente Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (CONAMP), Victor Hugo Azevedo, afirmou que, “a agilidade imposta para priorizar o projeto implica em uma inversão de pauta que contraria os anseios da sociedade. Ao invés de votar os projetos de lei que reforçam o combate à corrupção, às organizações criminosas e à impunidade, os parlamentares optaram por votar um texto que pode, eventualmente, inibir a atuação dos agentes encarregados de combater a corrupção.”
Segundo Victor Hugo, o projeto possui pontos que representam riscos à atuação austera do MP e de outras carreiras que operam no Sistema de Justiça Criminal. Ele teme que integrantes do sistema de justiça e segurança pública possam “estar suscetíveis a processos pelo fato de exercerem legitimamente suas atribuições, em especial no combate à corrupção e outros crimes graves”.
Com a aprovação a Associação de Magistrados Brasileiros (AMB) emitiu nota
O projeto de lei de abuso de autoridade, que teve o regimento de urgência aprovado na data de hoje, ainda precisa ser aperfeiçoado para o bem da democracia.
A necessária punição a quem atue com abuso de autoridade não pode servir, sob qualquer pretexto, a intimidar ou de qualquer forma subtrair a independência do Poder Judiciário e seus juízes, que tanto realizam no combate à corrupção, na garantia dos direitos fundamentais e na consolidação da democracia.
A AMB mantém diálogo constante com o parlamento na construção de um texto que garanta uma legislação eficiente na punição de quem se exceda no exercício do poder, mas que não impeça o exercício legítimo das funções do Estado. A pretexto de punir não se pode cercear o livre exercício do Poder Judiciário.
Brasília, 14 de agosto de 2019.
Jayme de Oliveira
Presidente da AMB
Fonte – Correio Brasiliense