Segundo jornais ‘Folha de S. Paulo’ e ‘O Globo’, interrupções identificadas pelo Instituto de Criminalística foram causadas pelo gravador usado pelo delator
A perícia do Instituto Nacional de Criminalística (INC) na gravação da conversa entre o empresário Joesley Batista e o presidente Michel Temer (PMDB) concluiu que não houve edições no áudio. A defesa de Temer questionou no Supremo Tribunal Federal (STF) a autenticidade dos arquivos apresentados por Joesley à Procuradoria-Geral da República, responsável por seu acordo de colaboração.
O laudo pericial será incluído no inquérito que investiga o presidente pelos crimes de corrupção passiva, obstrução de Justiça e organização criminosa, aberto a partir das delações premiadas de executivos do Grupo J&F. O documento é parte do relatório da Polícia Federal que tratará especificamente do suposto crime de obstrução cometido por Temer. A perícia já foi encaminhada à PGR, que deve apresentar denúncia contra Temer ao STF na semana que vem.
Segundo os jornais Folha de S. Paulo e O Globo, a perícia identificou cerca de 200 interrupções “naturais” no arquivo, atribuídas ao equipamento utilizado pelo delator para gravar o presidente. Segundo a Folha, o gravador de Joesley tem um dispositivo que pausa a gravação quando há silêncio e a retoma quando é identificado algum som.
Contratado pela defesa de Temer, o perito Ricardo Molina divulgou no dia 22 de maio um laudo em que contestou a autenticidade dos áudios feitos pelo empresário. “É uma gravação tão contaminada que não pode ser levada a sério. Ela só está sendo levada a sério pelo contexto político que a circunda. A Procuradoria é ingenua e incompetente. Aquilo é coisa de leigo e que não sabe mexer em áudio. Eles se esconderam atrás de frases como ‘índice provável de confiabilidade’. Essas duas pessoas [analistas do Ministério Público Federal] não entendem nada de áudio”, disse Molina.
Segundo o perito, havia cerca de 60 pontos potenciais de edição. “Não dá para dizer que é edição. Tem alguma falha sistêmica neste gravador”, afirmou. “A questão é: dá pra garantir que é autêntica? Não”. “Há inúmeras portas na gravação para quem queira fazer uma edição”, apontou Ricardo Molina, que afirmou a categoricamente que a gravação “não é a original”.
O perito ainda questionou: “por que a PGR [Procuradoria-Geral da República] se apressou em publicizar uma gravação tão nitidamente corrompida antes de submetê-la a uma perícia técnica rigorosa?”.
Temer foi gravado pelo dono da empresa e delator, Joesley Batista, em uma conversa no Palácio do Jaburu no dia 7 de março. No diálogo, o presidente diz “ótimo, ótimo” quando o empresário revelou estar “comprando” um procurador do Ministério Público Federal e “segurando” dois juízes, além de ter respondido “tem que manter isso, viu?” diante da afirmação de Joesley de que estava “de bem” com o deputado federal Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e o operador financeiro Lúcio Bolonha Funaro, ambos presos.
Na conversa, o empresário disse a Temer que precisaria de ajuda do Planalto para vencer um processo administrativo contra a Petrobras no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). O presidente, então, indica Rocha Loures como interlocutor de sua “estrita confiança” para atender à demanda do grupo J&F. Em encontro com o aliado de Michel Temer, Joesley prometeu que a ajuda renderia 500.000 reais semanais em propina durante 20 anos.
No dia 18 de abril, Rodrigo Rocha Loures foi flagrado pela Polícia Federal ao sair de uma pizzaria nos Jardins, em São Paulo, com uma mala recheada com 500.000 reais entregue pelo diretor de relações institucionais da JBS e também delator, Ricardo Saud. Rocha Loures acabou devolvendo o dinheiro no último dia 25.
Em outra frente do inquérito, que apura suposta corrupção passiva pelo presidente e Rocha Loures e foi entregue ao STF nesta semana, concluiu que há evidências que apontam “com vigor” para a prática do crime.